Diálogos URBANOS (#006)

18:45h

Na fila do supermercado, uma cliente e a caixa, ambas evangélicas, conversam freneticamente sobre as peripécias de Moisés na travessia do Mar Vermelho.

- Irmã, e ele fez não-sei-o-que-lá, não-sei-o-que-lá...

- Ô glória!!! Irmã, ele era danado, não era?

- Era sim irmã. Uma benção do Senhor!!

Me aproximo, interrompo a empolgação das duas e coloco sobre o balcão do caixa, minha cestinha de garrafas de Skol, cada uma de 1L, iguais as garrafas de Velho Barreiro da adega de meu finado avô Olavo.

- Boa noite. - Falo com voz de locutor de rádio.

A irmã-cliente me olha atravessado e diz:

- Qual a sua idade criança?!

- Trinta e um senhora.

- E você já bebe?!

- De leite-de-magnésia e carrapaticida até cana-de-cabeça.

Ela faz cara de malassombro e pergunta:

- Você já leu a Bíblia filho?!

- Duas vezes. Gostei muito do Apocalipse de João, embora essa tese de que tudo vai acabar com fogo já esteja ultrapassada. Acredito mesmo, no extermínio em massa por armas biológicas, tipo virose letal, pessoas morrendo de câncer de pele, essas coisas...

- Sangue de cristo!! - Ela diz baxinho.

- Falou senhora?!

- Perguntei se todas essas cervejas são pra você tomar?!

- Não, é que a samambaia lá de casa é alcólatra, se ficar sem álcool um dia que seja, ela mucha e tem flatulência noturna. Já pensou José Mayer, Thaís Araújo e fedentina juntos?

Ela abriu um sorriso amarelo, virou a cara, cumprimentou a caixa e saiu à francesa. Sermão por sermão, prefiro o da minha mulher quando esqueço de lavar o banheiro. Arriégua!!